Quadro Abaporu de Tarsila do Amaral

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Em muitos campos do conhecimento, assim como no artístico, há centros de referência e centros periféricos.

É desta forma que ninguém pode ser um verdadeiro filósofo sem ter a referência dos filósofos europeus, por exemplo.

No campo artístico, esta relação centro x periferia é igualmente marcante, pois existem muitas obras clássicas mais antigas do que o Brasil, que dirá de sua arte.

No entanto, sempre pode ocorrer o desabrochar de uma expressão artística local, inspirada pelos clássicos, mas, ao mesmo tempo, detentora de características únicas e, assim, digna de situar o país de origem como um novo centro de referência.

Pode parecer exagero mas, este é, talvez, o maior significado do quadro Abaporu, de Tarsila do Amaral.

O que se exprime não apenas pela visão posterior acerca da importância da obra, mas também pela visão dos criadores do movimento antropofágico, a partir do quadro de Tarsila.

Segundo a versão mais comum da história do quadro Abaporu, Tarsila entregou a obra para seu companheiro Oswald de Andrade em 1928, como um presente sem nome.

Este e um amigo, observando a pintura, teriam pensado em um nome que significasse uma expressão artística legitimamente brasileira, destacada do modernismo brasileiro.

Aboporu é uma palavra indígena, que significa literalmente “homem que come gente”, em referência ao artista que devora suas influências, para transformá-las em algo novo, totalmente original.

Quadro Abaporu de Tarsila do Amaral

Uma Breve Análise do Quadro Abaporu

Em termos gerais, esta obra de Tarsila do Amaral é caracterizada pelas cores vivas, mas, principalmente, pela temática original, tomando por base as lendas da cultura popular brasileira.

Na verdade, este é um dos principais elementos da obra e, segundo a própria pintora, a lenda inspiradora se referia a um gigante que se despedaçava e se recompunha, sempre de forma imperfeita.

Não por acaso, uma lenda que teria ouvido das mulheres negras que trabalhavam na propriedade em que vivia quando mais jovem e, por isso, além de representar a lenda em si, também funciona como uma alegoria valorizadora do trabalho.

Dos pés enormes à cabeça diminuta do gigante disforme, Tarsila escolhia dar destaque aos pés, em referência ao trabalho pesado, daqueles que estão sempre com os pés firmemente presos ao chão.

Mas, há inúmeras formas de se ler e interpretar a pintura e podemos dizer que o Abaporu moderno não é o mesmo que foi terminado em 1928, mas a soma das inúmeras perspectivas geradas pela obra ao longo de sua existência.

 

A Constante Releitura do Quadro Abaporu

A parte os quesitos técnicos e artísticos, o que realmente motiva o fascínio pela obra, como dissemos, é a possibilidade de releitura constante.

Afinal, a cabeça pequena significaria apenas o destaque anteriormente referido, aos pés e mãos dedicados ao trabalho pesado? Ou seria também uma referência sutil à falta de valorização da inteligência brasileira?

Assim como o Abaporu inspirou Oswald de Andrade a propor a digestão da arte clássica para a composição do novo, continua inspirando os analistas dispostos a digerir a própria  obra, conferindo sempre algum significado novo.

E se a própria Tarsila não havia pensado neste ou naquele outro significado, isso não autoriza pensar que todos estes significados não estejam no quadro.

Uma obra de arte, em geral, transmite mensagens conscientes e, também, inconscientes. Ao sair do forno, deixa de ser propriedade do autor, passando a ser o que o público quiser ou puder imaginar.

Ainda que certo sentido genérico, da representação de um povo trabalhador e sofrido, se mantenha em quase todas as interpretações.

 

O Valor do Quadro Abaporu

Por todo seu simbolismo e pela importância histórica e artística, o Abaporu está avaliado em mais de 40 milhões de dólares, sendo, possivelmente, o quadro brasileiro mais valorizado no mundo.

Porém, como os mais atentos devem saber, este valor só poderia ser confirmado (ou até ultrapassado) se houvesse um comprador em leilão, o que é muito pouco provável.

Da última vez que esteve em leilão, em 1995, foi arrematado por um empresário argentino por 2,5 milhões de dólares e, atualmente, fica exposta no MALBA, o Museu de Arte Latino Americana de Buenos Aires.

Ainda que já tenha retornado ao Brasil algumas vezes para breves exposições; a última, durante as Olimpíadas do Rio de Janeiro, em 2016; nada indica que o proprietário tenha intenção de abrir mão da obra.